Filosofia, Educação e Arte

“Imagens-força ... diferente de como é”

            Deleuze destaca que a vida é feita de singularidades, entre o “eu” e o “não eu” aquilo que concebo como premissa para a minha existência, seja a luz do sol que irradia e organiza a biologia da fauna e da flora, a energia vital que me instiga a sair das profundezas labirínticas do sono na busca da força que se esvai pelo cansaço, para reerguer-me e dar um passo em direção ao despertar, comunicando ao universo meus anseios e desejos que se esvaem com o passar dos anos, com as decepções e melancolias, me faço pelas migalhas de azulejos que o tempo não corroeu e também não sucumbiram aos terremotos e mantêm-se altivos apesar da massificação cultural.

 Foto: Hencke, J. julho, 2013 (acervo pessoal)
Foto: Hencke, J. julho, 2013 (acervo pessoal)

                “A filosofia é a arte de formar, de inventar, de fabricar conceitos” (Deleuze e Guattari, 1992, pág. 10), esta capacidade de “criar” e “recriar” o real como uma aventura do pensamento, com seus problemas, suas limitações e incoerências, uma abertura a vida, nas fendas das rachaduras, onde escorre o fio tênue de água que reluz, da planta que germina, da ave que quebra a casca do ovo e dá seu primeiro “pio” ao mundo, num continuum vir a ser homem, mulher, organismo pulsante, ser pensante, complexo, reflexivo, ou melhor, um ser que necessita “escrever como um cão que faz seu buraco, um rato que faz sua toca” (Deleuze e Guattari, apud Gallo, 2008), um ser que exprime seus pensamentos em palavras, rasga páginas, cria veias com o precioso líquido da vida e faz ecoar ao mundo sua dor, seus desejos, amores e rancores, deflagrando em sua carne o que o humaniza, seu oásis em meio ao deserto.
            Gallo (2008) destaca que “mais importante do que anunciar o futuro, parece ser produzir cotidianamente o presente, para possibilitar o futuro” (p. 59) é preciso viver a miséria do mundo em todas as suas múltiplas mazelas para vislumbrar novas formas de agir, investir em conhecimentos e diversidades, ou melhor, construir-se biologicamente, socialmente e culturalmente, comprometer-se com o devir. 
Foto: Hencke, J. julho, 2013 (acervo pessoal)


DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é Filosofia? Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992.

GALLO, Sílvio. Deleuze e a Educação. 2º ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

Palavras escritas, palavras ditas, significados e significantes, estabilizam e desestabilizam imaginários e sensações, a quem pertence aquele “tom” que ecoa pelo ar? Timbre, sintonia, ruídos e silêncios configuram a pirotecnia contemporânea, “ninguém” mais entende o que está acontecendo, será que estamos caminhando para o “buraco negro” do caos? Mas, o caos é germinador do cosmos, da organização da potencialidade de um presente e futuro, a vida pressupõe esta circularidade que se renova a cada amanhecer.





















Foto montagem: Hencke J., novembro, 2013. 



Eu, tu, nós: humanos?

            É noite, olho pela vidraça empoeirada de mais um dia quente e cansativo, estamos no final de outro ano, é novembro, faltam três dias para receber o pagamento e retornar a triste sina das contas que se acumulam mês após mês, tenho a sensação de que as forças e o ânimo que dantes me movia se esvai juntamente com os raios de sol, não tenho mais cinco anos, quando podia me recostar numa almofada e descansar após comer uma fatia de pão quentinho recém-tirado do forno, nem doze anos, quando a única preocupação era estudar para a prova de Língua Portuguesa, desta época se passaram décadas, me fiz mulher, às vezes menina, às vezes moleca, muitas vezes séria e outras brincalhona, todavia, cumpro responsabilidades, realizou minhas incumbências e sonho... sim sonho... e acredito em dias melhores, momentos felizes, alegrias efêmeras, pois a vida humana se faz de instantes que viram fumaça, pó, é na sutiliza que a beleza se apresenta, torna-se oportunidade e realização.
            Preciosa (2007) como seu próprio nome diz, demonstra a preciosidade bruta que cada um é, necessitando ser lapidado através das “águas” e “ventos” que perpassam nosso corpo, pois não é simples viver. Em suas palavras:

[...] A vida e seus surpreendentes desenhos arruínam nosso sensatos roteiros e nos conduzem a uma desconhecida aventura em que somos convidados a inventar outras formas de expressar a subjetividade, formas singulares que manifestem o que muda em nós (p. 44).

Foto montagem: Hencke, J., novembro, 2013.


Não é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso, entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus. (Clarice Lispector)


Depois de nós...

                Pontos em movimento, traços, linhas e cores, possibilidades de formar palavras ditas, ouvidas escritas e reescritas que transcrevem pensamentos, ansiedades e medos, Deleuze destaca que “escrever é um caso de devir, sempre inacabado, sempre em via de fazer-se, e que extravasa qualquer matéria vivível ou vivida” as quais ficarão marcadas “depois de nós”, quando nossa carne em putrefação virar pó, uma sutil lembrança, cujas linhas traçadas permanecerão enquanto forem lidas, revisitadas, questionadas e duvidadas.  
                O grupo musical  Engenheiros do Hawaii, trás na letra de uma das suas músicas, a efemeridade da vida, das relações e do tempo que escorre por entre nossos dedos, assim como o processo de escolarização tão longo e efêmero ao mesmo tempo, com tantas horas árduas acomodados em cadeiras duras que machucam nosso corpo, reprimindo-o e controlando seus movimentos, enquanto aprimoramos nossos ouvidos, olhos e escrita num movimento intenso de atenção e concentração e, muitas vezes, saímos deste espaço sem lembrar o que fizemos ali, mas, com a sensação de ter convivido com pessoas que gostamos...
            Por isto:
“Hoje os ventos do destino
Começaram a soprar
Nosso tempo de menino
Foi ficando para trás
Com a força de um moinho
Que trabalha devagar
Vai buscar o teu caminho
Nunca olha para trás

Hoje o tempo voa nas asas de um avião
Sobrevoa os campos da destruição
É um mensageiro das almas dos que virão ao mundo
Depois de nós

Hoje o céu está pesado
Vem chegando temporal
Nuvens negras do passado
Delirante flor do mal

Cometemos o pecado
De não saber perdoar
Sempre olhando para o mesmo lado
Feito estátuas de sal

Hoje o tempo escorre dos dedos da nossa mão
Ele não devolve o tempo perdido em vão
É um mensageiro das almas dos que virão ao mundo
Depois de nós

Meninos na beira da estrada escrevem mensagens com lápis de luz
Serão mensageiros divinos, com suas espadas douradas, azuis
Na terra, no alto dos montes, florestas do Norte, cidades do Sul
Meninos avistam ao longe
A estrela do menino Jesus”.

Foto montagem: Hencke, J. dezembro, 2013. 

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