O
ENSINO DA SOCIOLOGIA PARA PROFESSORES DO ENSINO MÉDIO
Contribuindo
para a formação continuada dos professores de Sociologia do ensino
médio do Rio Grande do Sul
O
Ensino da Sociologia no Brasil
Tarefa
01: Com base na leitura realizada elabore um exercício de
imaginação sociológica para desenvolver com seus alunos.
SILVA,
Ileizi Fiorelli (UEL). A Imaginação Sociológica:
desenvolvendo o raciocínio sociológico nas aulas com jovens e
adolescentes (Experiências e Práticas de Ensino). Roteiro
apresentado no mini-curso do Simpósio Estadual de Sociologia,
promovido pela Secretaria de Estado de Educação do Paraná, nos
dias 20 a 22 de Junho de 2005, em Curitiba-Pr.
Proposta
de atividade pedagógica
Um tema amplamente questionado tanto na área Filosófica, quanto
Sociológica e Artística é a existência do homem: Quem é o ser
humano? Como ele relaciona-se dentro da sociedade cotidiana e qual o
seu papel enquanto organismo vivo que estabelece relações? Assim
como Durkhein, relaciona a sociedade como um corpo humano e suas
organizações, deixam explícitos a todos a necessidade de
compreender que uma atitude eminentemente provoca outras
repercussões, ou seja, vive-se numa sociedade complexa onde as
relações estão imbricadas, apesar da fluidez contemporânea que
torna tudo efêmero e quase artificial. Entretanto tratar destes
assuntos dentro do cotidiano escolar no Ensino Médio apresenta-se de
forma abstrata e muito aquém da realidade dos estudantes, para
tanto, uma possibilidade de trabalho são as metáforas, textos que
se tornam pretextos para debate, análise e aprofundamento teórico.
Nesta proposta, com o intento de realizar um exercício de
imaginação sociológica, lançar-se-á mão do texto “O Cuidado
dos Grandes pelos Pequenos”, autoria de Leonardo Boff, numa análise
acerca do descaso e descuido que nós, seres humanos, temos com a
natureza biológica e social.
O
cuidado dos grandes pelos pequenos
Leonardo
Boff
Andando por minha rua, onde quase ninguém passa,
contabilizei, em apenas 50 metros, 58 besouros mortos. Como não
reparamos nesses nossos irmãos mais pequenos, pisamos neles e
nossos carros os massacram. São Francisco se os visse mortos,
choraria de compaixão. Foi então que me lembrei de um belo mito
dos índios Maué,da área cultural do Tapajós-Madeira, que muito
nos tem a ensinar. Relato o mito e cada qual tire lá suas lições
que podem ser ecológicas e até de política internacional.
Reza o mito: Quando o mundo foi criado não existia a
noite. Havia só o dia e a luz penetrava em todos os espaços. A
luz só não chegava nas águas profundas do rio. Os Maué, por
mais que quisessem, não conseguiam dormir. Viviam cansados e com
os olhos irritados pelo excesso de luz.
Certo dia, um deles encheu-se de coragem e foi falar
com a Cobra Grande, a sucuriju, toda escura, considerada a senhora
absoluta da noite. Era ela que mantinha a noite presa no fundo
mais fundo das águas.
A Cobra Grande ouviu as lamentações do índio. E
vendo a pele dele, amorenada pelo sol escaldante e os olhos
avermelhados pelo excesso de luz, teve pena dele. Relutando muito,
por causa dos riscos, propôs um pacto:
"Eu
sou grande e forte. Sei me defender. Não preciso de ninguém. Mas
muitos dos meus parentes são pequenos e indefesos. Ninguém cuida
deles. Especialmente vocês andam por ai sem olhar onde pisam e
assim os matam sem piedade. Como eles vão se defender? Então, eu
lhe proponho a seguinte troca: Você me arranja veneno e eu
cuidarei de distribuí-lo entre os meus parentes pequenos
indefesos. Os grandes não precisam dele porque podem se defender
sozinhos. Assim vocês, Maué, quando caminharem por aí, olhem
bem onde vão meter os pés para não pisar nos bichinhos
pequenos. Agora eles terão como se defender. Em troca lhe darei
um coco cheio de noite".
O Maué aceitou proposta. Correu para o mato e logo
estava de volta, com o veneno para a Cobra Grande. E ela em troca
lhe entregou um coco, cheio de noite. No momento da troca, ela
ainda recomendou: "De jeito nenhum abra o coco fora da
maloca". O índio prometeu manter o pacto. Mas os demais
índios ficaram loucos de curiosidade. Queriam conhecer naquele
momento mesmo a tão ansiada noite. Juntos abriram o coco bem no
meio do roçado. E foi então que sobreveio a desgraça: trevas
cobriram o mundo. Não se via mais nada. E uma angústia
imprevista e terrível invadiu o ânimo dos Maué.
Houve uma correria geral. No foge-foge precipitado,
ninguém pensou nos bichinhos pequenos que já haviam recebido
veneno da Cobra Grande. Os primeiros a receber foram as aranhas,
as cobras pequenas e os escorpiões. Esses se defenderam das
pisadas dos indios mordendo-lhes os pés e as pernas. Foi aquela
calamidade.
Os poucos que sobreviveram às mordidas venenosas,
sabem agora como se comportar. E a partir de então todos
começaram a tomar cuidado com os bichinhos pequenos para não
pisar neles e não serem mordidos, convivendo pacificamente e no
maior respeito mútuo. Por que será que nossos grandes não
cuidam de nossos pequenos?
Referências:
BOFF,
Leonardo. O cuidado dos grandes pelos
pequenos. Disponível em:
http://www.leonardoboff.com/site/vista/2003/nov28.htm.
Acessado em: agosto.2012.
A intenção é despertar a atenção do estudante para o espaço
que ocupamos e analisar as microrrelações e macrorrelações que
existem nestes locais, sendo a interação entre seres humanos, meio
ambiente e animais um campo de análise para as estruturas sociais.
A partir da leitura poderá ser feita uma bateria de
questionamentos, que giram em torno da questão metafórica do
cuidado e da responsabilidade social, pois, quando se dá uma palavra
em um acordo esta deve ser cumprida apesar de todas as possíveis
consequências, caso contrário o que ocorrerá deverá ser de
responsabilidade de todos que não souberam cumprir sua palavra.
O texto poderá ser esmiuçado e percebido de diferentes maneiras:
como nos relacionamos com o meio ambiente? Como nos relacionamos com
os demais seres vivos? As formas de relação que estabelecemos são
saudáveis? A partir destas indagações o trabalho poderá ser feito
a partir da saída de campo e observação do meio físico-social,
registro fotográfico, mapeamento das imagens, produção de
reportagens e/ou pesquisa de reportagens sobre como o humano
relaciona-se com o ambiente, parte-se do texto para construir
possíveis ligações sociais e partir para uma análise mais densa
da organização social e cultural do modelo capitalista que
proporciona uma existência materialista e individualista.
Esmiuçando a proposta da aula, que poderia ser desenvolvida da
presente forma:
* Conversa sobre quem é o ser humano e como este relaciona-se
socialmente, quais as formas que estabelece para conviver com o
outro, seja ele da mesma natureza biológica, animal ou vegetal;
* Leitura do texto: O cuidado dos Grandes pelos Pequenos de
Leonardo Boff;
* Transposição do mito para a realidade social de cada um a
partir de uma análise quanto nossas formas de relação, o texto
será utilizado para debate e compreensão do principio de
organização social;
* Registro escrito através de tópicos sobre as relações que
vimos no texto e que entabulamos socialmente;
* Debate coletivo (aqui podem ser introduzidos conceitos de homem,
sociedade), registro escrito das principais peculiaridades entre as
relações sociais que estabelecemos e as presentes no texto, a
intenção é dês naturalizar o olhar para promover uma nova ótica;
propõe-se um estranhamento da própria realidade, buscar entender o
motivo das relações não simplesmente aceitá-las. E, através
desta nova ótica estabelecer uma relação com o conhecimento
sociológico.
Reflexão acerca do exercício de imaginação sociológica realizado na
aula presencial do dia 19.janeiro.2013
Arbitrariamente ou não vivemos num
âmbito fechado de preocupações: trabalho, estudo, família, alimentação,
moradia, violência, drogadição, problemas ambientais, inexistência das relações
interpessoais, desemprego e subemprego, dentre outro fatores; aturdidos com
esta problemática acabamos nos embrenhando dentro de nossa mente e esquecemos
de ver o que há além destes temores, tornando-nos seres humanos ocos e despidos
das possibilidades de inventar/criar relações; todavia está não é uma
problemática individual e sim social; a sociedade transforma-se diariamente e
são entabuladas novas formas de relação que deveras deixam de articular com o
humano enquanto ser que age, interage, tem sensibilidades e sentimentos.
Há mudanças estruturais que alteram
as formas de relações do humano, muitas vezes não percebidas de forma
conscientes, neste emaranhado Mills (1969) destaca a necessidade de realizar-se
exercícios de imaginação sociológica; dentro da instituição escolar trata-se da
possibilidade de compreender as modificações sociais através de uma análise
interna, crítica e analítica, ou seja, ver a si mesmo dentro da esfera
planetária e cultural.
Conforme o autor a imaginação
sociológica possibilita uma compreensão mais ampla da sociedade; para entender
a sua existência o individuo necessita analisar a sociedade através de suas
vivências. Este exercício permite ver as transformações sociais que nos afetam
de forma inserida nela.
Imaginar é passar de uma perspectiva
a outra, analisando-as através de nossa própria bibliografia pessoal, onde
podemos criar cruzamentos entre aquilo que acreditamos e o que vivenciamos e
buscar em nossas raízes respostas contundentes às nossas dúvidas, trata-se de
averiguar as perturbações pessoas dentro de uma esfera social.
O autor ainda alerta sobre um dos
graves problemas que está nos assolando na contemporaneidade: a indiferença,
que se constitui pela falta de crenças e valores, despencando para um quadro
crítico de ansiedade, depressão e possivelmente morte (suicídio, doenças
crônicas desenvolvidas em detrimento da depressão um quadro de inquietação e
indiferença, uma vida vazia de significados).
Com base nesta leitura textual fomos
desafiados a assistir um vídeo sobre as diferentes formas de “ver e agir no
mundo”, a partir de sua análise, em grupos, realizou-se um debate acerca dos
cinco problemas atuais que assolam a humanidade, em seguida houve a apresentação
dos grupos e uma conversa.
Após toda esta introdução acerca da
imaginação sociológica, chegou à etapa da introspecção, ou seja, o problema
elencando por todos os grupos deveria ser pensado, analisado individualmente e
relacionado com nossa biografia de vida, de que maneira aquele tema nos atinge?
Por que ele é tão presente e preocupante na atualidade? Quais são os motivos
que nos levam a temê-lo? Obviamente um bom desafio de imaginação: inserir-nos
dentro do contexto social a partir de nossa subjetividade. Eis a seguir o meu
relato autobiográfico acerca do tema “violência”.
Em que medida a violência interfere
nas relações que entabulo diariamente, é possível minimizar esta problemática?
O que a violência germina na sociedade? Violência gera o quê?
Vejo-me vagando pelos inumeráveis
neurônios cerebrais que me levam a mais tenra idade e ao alcoolismo presente em
meu progenitor, um excelente pai, admirável marido quando sóbrio, mas era
apenas uma dose de cachaça (sim pinga ou cerveja), e toda sua personalidade se
transfigurava e obstruía seu pensamento apunhalando através de palavras ácidas,
gestos mordazes e ações agressivas seus familiares (filhos e esposa), em
detrimento de todas as maledicências que a vida lhe impunha, como se nós, reles
crianças, tivéssemos culpa de seu infortuno. Naquela época a agressão contra
esposa e filhos era presente em praticamente todos os lares, tido como algo
normal, comum e até aceitável, eis a primeira forma de aceitação velada da
violência vivenciada no lar e reafirmada nas escolas, perpetuando machismos,
preconceitos e atemorizando corações jovens e repletos de sonhos.
Neste ínterim a violência está
presente na mais tenra idade e é vista, reproduzida e vivência até o momento
que inspiramos no leito de morte, entretanto, o mal que nos atinge é a
indiferença, banalizamos a agressão e a naturalizamos, com jargões, ignoramos o
sofrimento alheio, nos fechamos em nosso mundo obstruído de luz, por medo de
mostrar quem somos e assim voltar a ser vitimas da violência, não mais a física
que causa dor momentânea, mas a psicológica que nos leva a degradação biológica
e a morte espiritual, tornando-nos cascas/ocas destituídas de sonhos, desejos e
personalidades.
Pode-se dizer que são limitações que
convivemos diariamente e querendo ou não lançamos mãos da violência ao agir
impulsivamente de forma agressiva/voraz/individualista porque temos medos,
ansiedades, inseguranças, além de uma precária confiança em nossa personalidade
(melancolia, depressão, infelicidades), construímos nosso dia a dia num ritmo
frenético e alucinógeno de trabalho que nos obriga a sacrificar horas de lazer
para uma formação/melhoria profissional, tornando-nos máquinas e não seres humanos.
A violência causa o desequilíbrio autopoiético
(Maturana e Varela), ou seja, neste momento a organização biológica fica
debilitada e a racionalidade/emotividade não se equilibram gerando neuroses e
psicoses, pois bem, há traumas que destituem a estruturação humana e
impulsionam a perpetuação de um mundo amparado na falta de valores, de
amizades, de amor, tornando-se frio, desumanizado e materialista.
Referências:
MATURANA,
Humberto; VARELA, Francisco. A Árvore do
Conhecimento: as bases biológicas do entendimento humano. Tradução: Jonas
Pereira dos Santos. Editora Psy II, Campinas – São Paulo, 1995.
MILLS, G. Wright. A Promessa.
In: MILLS, G. Wright. A
imaginação Sociológica. Trad. Waltensir Dutra. 2º ed. Rio de Janeiro: Zahar
Editores, 1969, pp. 09-32.
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