domingo, 28 de junho de 2009

Inclusão... reflexões


Na vida sempre há um caminho... é preciso saber qual seguir...


Pinceladas sobre Inclusão


Fala-se na atualidade muito em educação especial, educação para a inclusão ou integração de alunos com necessidades educativas especiais dentro do âmbito escolar básico, porém pouco se observa de iniciativas públicas e coerentes com a proposta abarcada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, pois, antes desta não havia leis que regulamentavam e, em si, “obrigavam” a disponibilização de uma escolarização para todos, sem exceção de raça, cor, etnia, grupo sanguíneo, fator Rh positivo ou negativo, síndrome cromossômica e outros.
O maior impasse não são os problemas físicos e/ou mentais, mas, por sua vez, a pior síndrome é o preconceito, aquele que martiriza e desmoraliza qualquer auto-estima, a família sente-se acuada e retraí-se, cai naquela história de que esta é somente sua responsabilidade, ou, por outro lado, abandona seus filhos e os excluí.
Uma boa maneira de olhar para a escola e a sociedade, é através de um belo livro escrito por José Saramago “Ensaio sobre a Cegueira”, que abarca uma reflexão profunda sobre uma sociedade em que todos perdem a acuidade visual e se tornam cegos, esta cegueira inicia aos poucos em um instante de descuido em um e outro sinal na rua, porém cada incidente vai causando problemas maiores, os governadores tentam recolher os cegos e confiná-los em grandes prédios, manicômios, quartéis abandonados, alimentando-os de maneira rarefeita, até que um dia, todos percebem que convivem carnalmente com a “podridão” da humanidade, os piores desejos são manifestados e uma única pessoa, que incrivelmente não ficou cega, vê e sofre com a imundice da “razão” humana.
É uma boa metáfora para refletir-se perante uma escola que eleva os padrões da modernidade, tentando transformar seus alunos em objetos idênticos, homogêneos, padronizados. Uma grande falácia por sinal, pois assim transmite, exatamente esta palavra, conhecimento que eram prementes de um padrão clássico de educação, aprendia-se apenas o que era cabível aos mecanismos de manutenção de uma mesma ordem social de educação, o “status quo”.
Em sua égide o movimento deveria ter sido alterado pois não existiria inclusão, se não houvesse a exclusão inicial, mas sem delongas é preciso falar precisamente da educação especial que vivenciamos, pois, filosoficamente e sociologicamente existem boas argumentações e pesquisas, mas no campo da possibilidade estamos engatinhando vagarosamente.
A cegueira a qual se refere José Saramago, não é aquela congênita e nem adquira, mas é a cegueira de conhecimento, do social, mas será que é preciso partir do extremo para conseguir-se alterar a sociedade?

“Não encontrou nada na córnea, nada na esclerótica, na íris, nada na retina, nada no nervo óptico, nada em parte alguma. Afastou-se do aparelho, esfregou os olhos, depois recomeçou o exame desde o princípio, sem falar, e quando outra vez terminou tinha na cara uma expressão perplexa. Não lhe encontro qualquer lesão, os seus olhos estão perfeitos”. (p. 23 – SARAMAGO, José. Ensaio Sobre a Cegueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1995)

Agora cabe refletir na esfera das micro-relações, como está sendo desenvolvido o processo de reformulação educacional para abarcar os problemas gerados ou não por esta inclusão tardia, e, certamente, pouco comprometida com a melhoria da educação.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 em seu capítulo V, artigo 58, realiza uma explanação simples, porém complexa, referindo-se a quem é esta “clientela”, delegando as responsabilidades para a instituição educacional falível que ainda procura-se sustentar nesta época problemática:

“Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades educativas especiais.
§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial.
§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições especificas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.
§ 3º A oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil” (BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9394/96. Brasília, DF: Senado Federal, 1996.)

A lei, por via de regra, está dada, agora está nas “mãos” das escolas e suas mantenedoras criarem estratégias e políticas públicas que possibilitem um efetivo trabalho proporcionando desta maneira, a verdadeira inclusão, tem-se a pretensão de trabalhar com o âmbito da eqüidade, compreendendo e não tolerando as diferenças, articulando com os múltiplos saberes e constituindo um currículo real e aplicável para todos aqueles que compõem a escola. É preciso se adaptar, porém, inevitavelmente está adaptação pressupõe o diálogo, o erro, a reflexão e uma nova ação.
Este diálogo não deveria ser reservado e realizado apenas quanto à educação especial, mas deveria ser prática cotidiana da escola, para lidar em todas as situações, problematizando-as, alavancando hipóteses, confirmando ou desmistificando teses.
Historicamente deixou-se os diferentes, deficientes, mal formados, segregados em instituições especiais para este fim, hoje, não é admissível tal crueldade, porém, será que a inclusão que vem sendo feita, não é uma maneira de mascarar esta herança discriminatória?
O grande “boom” ocorreu no ano de 1994, em uma conferência mundial que proclamou a urgência de alterar a maneira de lidar com aqueles sujeitos que eram e ainda são “portadores” de necessidades educativas especiais, surgiu então um documento primordial na reformulação deste quadro à conhecida “Declaração de Salamanca”.
Passaram-se já uma década e pouco alterou-se, onde estão os problemas? Como mudar este paradigma educacional excludente? Perguntas germinam e crescem a olhos nus, mas alternativas possíveis são poucas e microscópicas. Este parece o panorama de um olhar desolado que almeja o fim da história, não é, bem pelo contrário procura entre as brechas e as falhas possibilidades de reinventar a escola, em um campo do diálogo e da construção sócio-cultural. Talvez não apresente-se pistas e repostas, mas pinceladas de um mapa de dúvidas, convites e procuras para refletir.
Pois traçar possibilidades no plano de políticas públicas enrijecidas sobre o viés da exclusão, é para muitos, incômodo e desolador. Não pretende-se valer da hipocrisia, adentrado os portões das escolas com alunos considerados deficientes (não em um sentido pejorativo, pois eles não portam uma deficiência e sim a possuem), mas possibilitar a estes o acesso ao ensino regular em uma classe regular, sendo que o professor regente possua um professor que lhe auxilie em seu trabalho, pois, se a educação brasileira estivesse trabalhando e formando docentes para lidar com a diversidade, um grande passo já teria sido dado, mas a política educacional ainda prima o viés moderno, em que procura submeter as diferenças a um ideal homogêneo de atuação.
Da mesma maneira, existem casos sérios de deficientes mentais que dificilmente conseguirão ser incluído em uma classe regular, mas, aqueles que o acesso a está é possível, certamente devem ser incluídos, realizando os trabalhos propostos de maneira integrada e coletiva, respeitando suas limitações e incentivando suas possibilidades.
A escola que trabalha com a diversidade, possui um currículo flexível, exigindo e definindo a todos objetivos comuns, porém a maneira que cada aluno demonstrará para alcançar tais objetivos é diferenciada, deve-se trabalhar com as potencialidades, desafiando-os, ao invés de enaltecer as dificuldades.
A escola inclusiva deve estabelecer um diálogo continuo entre pais, alunos e professores, juntamente com uma equipe de apoio, “os conhecidos especialistas”, não faz-se jus de que esta é a melhor maneira de agir, mas o docente, bem como a família, precisa ser auxiliada no esclarecimento de dúvidas e de estratégias para lidar com determinadas crises, dificuldades graves destes alunos “deficientes”. Exemplificando, um aluno cego não possui deficiência mental, mas historicamente fora segregado a condição de alguém que não aprende, porém, se mudar o enfoque do modelo de aprendizagem incluindo este aluno num mundo tátil e audível, o professor precisará conhecer o Braile e para isto um “facilitador” da inclusão seria necessário, bem como cursos contínuos de formação e aprimoramento docente.
Será que não é preciso rever o conceito de sociedade que temos, tornando-a mais inclusiva e menos segregadora?
A inclusão é uma questão sócio-político-cultural, é preciso elaborar políticas públicas que contemplem um novo olhar para o social, um olhar de esperança que acredite nos potenciais de cada um, vendo-os como diferentes e únicos.

“Por que foi que cegamos, Não sei, talvez um dia a gente chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegamos, penso que estamos cegos. Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem.” (SARAMAGO, p. 310)

Está frase sintetiza o problema da educação inclusiva, existem poucas possibilidades, pois os recursos são rarefeitos, os professores estão despreparados, as escolas não apresentam infra-estrutura mínima, as leis são verticalizadas e impostas, mas a nossa cegueira impede o movimento inclusivo, sabe-se que não é, nem está sendo fácil, mas é preciso além de boa vontade interesse dos governantes e humildade para aprender no dia a dia.
Jésica Hencke

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